Mestre em Teologia. Doutorando em Teologia
Pastoral, IAE ct., Eng, Coelho, SP.
Diretor e professor do SALT-IAENE, em
licença.
A divindade e a pré-existência de Cristo foram
aspectos doutrinários da Cristologia, que se estabeleceram, progressivamente,
no seio IASD até a primeira metade do século XX. Os unitarianos, procedentes
dos congregacionalistas, se estabeleceram, durante a história americana, na
região da Nova Inglaterra (berço do adventismo sabatista) como um movimento
anti-calvinista e contrário à ligação Igreja e Estado, por isso são chamados de
“Ala Esquerda.”1
Os movimentos religiosos
surgidos nessa região sofreram essa influência teológica anti-trinitariana.
Nesse contexto, emergiu entre outras seitas (Universalistas, Batistas do Livre
Arbítrio), o grupo religioso arminiano denominado de cristãos, também
conhecidos como Conexão Cristã (anti-calvinista e anti-trinitariano).2
O órgão de comunicação da
Conexão Cristã para o leste dos Estados Unidos era o The Christian Herald and
Journal. Essa publicação cedo se identificou com o movimento milerita. Em seu
número de 3 de dezembro de 1840, o editor Philemon R. Russel critica a Josias
Litch por ter posição favorável à Trindade, pois, segundo ele, (Russel), os
cristãos não são trinitarianos. Por outro lado, Guilherme Miller, a principal
figura do movimento milerita, no seu segundo artigo de fé, datado de 5 de
setembro de 1842, demonstrou crer que a Divindade era constituída de três
pessoas distintas. A origem religiosa de outros mileritas, contudo, atesta sua
posição favorável à doutrina da Trindade, pois eram em sua maioria procedentes
da Conexão Cristã.
Em janeiro de 1846. Tiago
White se pronunciou contra a doutrina da trindade e da eternidade divina de
Jesus Cristo. No artigo “The Seventh-day Sabbath not Abolished”, de fevereiro
de 1854, J.B. Frisbie declarou-se anti-trinitariano, por considerar tal
conceito como sendo de origem pagã. No mesmo ano, James M. Stephenson negou ser
Cristo co-existente e co-eterno com o Pai. No início de 1859. Uriah Smith
registrou sua crença de que o Espírito Santo é apenas um princípio de vida.
Três anos depois, D. Hildereth manifestou a mesma opinião. Em 1869, J. N.
Andrews declarou que só o Pai é o único ser do Universo que não tem início,
enquanto R. F. Cottrell afirmou, no mesmo ano, que a Trindade é uma perigosa
doutrina procedente do papado. O pastor D. E. Robinson, que era íntimo da
família White, afirmou, em 1871, que James White permaneceu contrário ao
trinitarianismo até a sua morte.
Apesar de toda rejeição
de se escrever um credo, em 1872, os adventistas sabatistas apresentaram suas
crenças no livro Fundamental Principies. Parece que houve, então, uma
disposição propositada em omitir qualquer declaração sobre a Trindade. Isto por
si só permite admitir que, possivelmente, havia uma tendência contrária ao
trinitarianismo.
O Instituto Bíblico
reunido na primavera de 1877, em Oakland, na costa do Pacifico, deixou
transparecer, através de seus palestrantes, que o Espírito Santo é uma mera
emanação ou influência proveniente da parte de Deus. Importantes líderes do
movimento adventista, portanto, repudiavam a doutrina trinitariana. Josué
Himes, Tiago White, José Bates, J. N. Andrews, John Loughborough, Uriah Smith,
J. H. Waggoner, D. M. Canright e outros manifestaram sua rejeição em considerar
Jesus Cristo como co-eterno e da mesma substância do Pai, igualmente negaram
que o Espírito Santo fosse um ser pessoal. Durante o século XIX, a maioria dos
líderes e escritores adventistas era anti-trinitariana e via o Espírito Santo
como uma energia, que possibilita a presença de Deus em todo lugar. Ao mesmo
tempo, Jesus Cristo era considerado como não tendo a mesma substância do Pai,
nem sendo co-eterno e pre-existente com Ele. O Filho de Deus era considerado
como subordinado e derivado do Pai.
Havia pelo menos, sete
razões por que os primeiros adventistas rejeitavam a doutrina da Trindade, e
com ela a divindade de Cristo e a personalidade divina do Espírito Santo; para
eles (1) a doutrina da Trindade era anti-escriturística, (2) o trinitarianismo
foi considerado contrário ao bom senso (irrazoável), uma vez que confunde as
pessoas da Trindade e o número delas, (3) destruía a personalidade de Deus,
porque consideravam-nO como um ser incorpóreo. (4) subvertia a doutrina da
expiação por não crer que o divino morreu em Cristo, (5) o trinitarianismo
originou-se do paganismo, porque ensinava o politeísmo, (6) era uma herança
teológica do papado e (7) opunha-se à vida devocional. pois não via em Deus uma
pessoa definida.
Nesta fase da crise
cristológica estava em jogo o futuro do que seria a Doutrina de Deus dos
adventistas do sétimo dia. O direito de se crer ou não em Cristo como sendo da
mesma natureza de Seu Pai envolvia a aceitação ou a rejeição da Trindade e,
portanto, da personalidade divina do Espírito Santo, além de comprometer a
finalidade missiológica dos adventistas do sétimo dia.
A suplantação desse
conflito doutrinário foi um processo gradativo. D.T. Boudeau é chamado por
Russel Holt de o “precursor do trinitarianismo”, pois, tão cedo quanto 1864,
ele declara Jesus como sendo igual a Deus e possuindo toda a plenitude da
divindade. Doze anos depois, registra-se uma declaração de Tiago White em que a
crença dos adventistas do sétimo dia na divindade de Cristo era muito próxima
do conceito trinitariano. No mesmo ano (1876), N. Downer declarou que a
ressurreição de Cristo foi um ato próprio, de Deus Pai e do Espírito Santo,
referindo-se assim às três pessoas da Divindade.14 Essas
declarações são uma evidência que havia pessoas entre os adventistas do sétimo
dia estudando o tema da Trindade.
A última década do século
XIX marcou o período da mudança no estabelecimento da divindade de Cristo, na
aceitação da personalidade divina do Espírito Santo e da doutrina da Trindade.
Quinze anos após a declaração de Dower (1891), Lee S. Wheeler comentando
Efésios 4:4-6, declara que, nessa passagem e em muitas outras da Escritura, é
feita uma distinção entre o Pai, o Filho e o Espírito. Um ano depois, foi
editado na Bible Student's Library dos adventistas do sétimo dia, um artigo de
Samuel T. Spear (pastor batista), sob o título de “The Bible Doctrine of the
Trinity.” Em 1895, Alonzo T. Jones pregou na sessão da Conferência Geral, um
sermão em que apresentou o relacionamento pessoal entre o Pai, o Filho e o
Espírito Santo. No mesmo ano aparece mais uma declaração de Ellen White sobre o
assunto, quando afirmou que há “três pessoas viventes no trio celestial”. Em
1898, é publicada a primeira edição do livro Desejado de Todas as Nações onde
ela declara, entre outras coisas, que, em Cristo, há vida original, não
derivada. Ellen White é o ponto decisivo para o entendimento da Divindade para
os adventistas do sétimo dia. Outro fator também relevante foi o falecimento da
maioria dos líderes unitarianos até o início da primeira década do século XX. É
em parte por isso que a IASD retardou sua visão missiológica por cerca de 57
anos (1901).
As declarações de fé dos
adventistas ao longo de sua história demonstram uma clara mudança sobre o
assunto. Foi, contudo, em 1931, que os adventistas afirmaram a Divindade como
três pessoas co-eternas, onipotentes. onipresentes e oniscientes. Depois, o
relatório da Conferência Bíblica de setembro de 1952 deixou confirmada a
plenitude da divindade de Cristo como aparece no livro Our Firm Foundantion. Cinco
anos depois (1957), publicou-se o livro Questions on Doctrine preparado por um
representativo grupo de líderes e eruditos adventistas do sétimo dia,
apresentando ao mundo evangélico um claro perfil evangélico da doutrina
adventista do sétimo dia. E, em 1971, o pastor LeRoy E. Froom pôs na mão da
igreja sua discutida análise sobre 1888. enquanto contribuía decisivamente para
o estabelecimento final do conceito de Trindade, da plenitude da divindade de
Cristo e da personalidade divina do Espírito Santo. Conceitos esses
confirmados, posteriormente, pela declaração das Crenças Fundamentais, votada
na Assembléia Geral de l980, em Dallas. Dessa forma este aspecto da crise
cristológica estava suplantado.
(Artigo extraído da
REVISTA TEOLÓGICA do SALT - IAENE, Vol. 1, Janeiro - Junho 1997, número 1,
páginas 26 a 30)