Comentário da lição da Escola Sabatina do 3º Trimestre de 2006

 

O EVANGELHO, 1844 E O JUÍZO

 

 

LIÇÃO 5 – DANIEL 8

 

 

De acordo com o cronograma de estudo da lição neste trimestre verificamos que o objetivo da lição desta semana será mais no sentido de reforçar o princípio do paralelismo progressivo entre as profecias de Daniel 2, 7 e 8 estabelecendo firmemente a seqüência dos eventos descritos nestas profecias, de forma que importantes assuntos como à identificação do chifre pequeno, seu ataque contra o santuário e a sua posterior purificação será analisado de forma mais detalhada respectivamente nas lições nº. 10, 11 e 12.

 

Antes de qualquer coisa, seria interessante posicionarmos cronologicamente a 3ª visão de Daniel, relatada no capítulo 8 (a 1ª está no cap.2 e a 2ª está no cap.7). De acordo com o verso 1 de Daniel 8 sabemos que esta visão se deu no terceiro ano do rei co-regente Belsazar, ou seja, cerca de dois anos após a visão do capítulo 7. Temos então que a cronologia dos capítulos 1 a 8 pode ser assim definida em datas aproximadas:

 

 

Ano a.C.

605

602

594

569

553

551

539

538

Capítulo

1

2

3

4

7

8

5

6

Evento

Cativeiro

1ª Visão de Daniel

Fornalha Ardente

Doença de Nabuco-donosor

2ª Visão de Daniel

3ª Visão de Daniel

Banquete e Queda de Babilônia

Cova dos Leões

Idade de Daniel

17

20

28

53

69

71

83

84

 

 

Como podemos ver a visão de Daniel relatada no capítulo 8 aconteceu quando o império Babilônico tinha ainda cerca de 12 anos de existência. Nesta ocasião o rei Nabonidus estava em Temã, enquanto seu filho co-regente Belsazar estava em Babilônia conduzindo a economia da capital ao colapso.

 

 

Paralelismo Progressivo

 

O Princípio do Paralelismo Progressivo é fundamental para a correta interpretação das profecias de Daniel. Este princípio está clara e irrefutavelmente evidenciado nas profecias relatadas nos capítulos 2, 7 e 8, de forma que podemos, sem muito esforço (sem forçar uma interpretação), perceber como as informações são ampliadas e detalhadas nas visões que se sucedem. Desprezar o evidente e natural paralelismo destes capítulos significa cometer um gravíssimo erro de interpretação, distorcendo completamente seu real significado, e desvirtuando um outro princípio fundamental de interpretação das Escrituras Sagradas: “a Bíblia explica-se a si mesma”.

 

O quadro abaixo demonstra a lógica e perfeição desta estrutura paralela e progressiva:

 

 

Capítulo 2

Capítulo 7

Capítulo 8

Interpretação

Período

Cabeça de Ouro

Leão com asas de Águia

 

Império Babilônico

7º e 6º século a.C.

Peito e Braços de Prata

Urso que se levanta de um lado

Carneiro com dois chifres

Império Medo-Persa

Do 6º ao 4º século a.C.

Quadris e Coxas de Bronze

Leopardo com 4 cabeças e 4 asas

Bode com um chifre que dá lugar para outros 4 chifres

Império Greco-Macedônico

Do 4º ao 2º século a.C.

Pernas de Ferro

Animal terrível e espantoso

Chifre Pequeno que cresce muito  politicamente 

Império Romano

(Roma Pagã)

Do 2º século a.C. ao 6º século d.C.

Pés em partes de Ferro e Barro

10 chifres sobre o 4º animal

Chifre Pequeno

se engrandece

espiritualmente

e ataca o

Santuário

Nações da Europa

Do 6º século d.C. até o fim

 

Chifre Pequeno

Papado

(Roma Cristã)

 

Tribunal Celestial

Santuário Purificado

Juízo Pré-advento

 

Pedra destrói a Estátua

4º animal (chifre pequeno) perde seu domínio e é destruído

 

2ª Vinda de Jesus

 

Pedra transforma-se num grande monte que enche a terra

Os santos do Altíssimo recebem o Reino

 

Eternidade dos salvos no Reino de Deus

 

 

 

O fato de o Império Babilônico estar em franca decadência e em fase de extinção, explica o motivo da visão do capítulo 8 começar com o símbolo do Império Medo-Persa. Babilônia foi simplesmente desconsiderada em razão de restar-lhe apenas uns poucos anos mais de existência.

 

A forma explícita e direta como os símbolos do carneiro (no verso 20 como os reis da Média e da Pérsia) e do bode (no verso 21 como o rei da Grécia) são identificados confirma de forma inquestionável a interpretação dos mesmos reinos simbolizados de outras formas nas visões anteriores.

 

Qualquer tentativa de interpretação que desconsidere este evidente paralelismo entre as profecias, soará como estranha e forçada, para não dizer ridícula.

 

É impossível não percebermos a relação que existe entre o urso que se levantou de um dos lados com o carneiro com dois chifres onde o chifre que se levantou por último se tornou o mais proeminente. A história nos conta que Ciro era neto de Astíages, rei da Média. Este concedeu ao seu neto Ciro o governo da Pérsia que até então era apenas uma província da Média. No ano de 553 a.C. Ciro rebela-se e subjuga a Média tornando-se maior que o poder que antes o subjugava. Ao conquistar Babilônia no ano 539 a.C. a Pérsia estabelece seu império mundial, de forma que o poder que havia se levantado por último (Pérsia) acabou se tornando maior que a Média.

 

É igualmente notória a relação existente entre o Leopardo com quatro cabeças e o Bode com um chifre notável que ao seu tempo é arrancado e substituído por outros quatro. Assim como os detalhes dos dois chifres do Carneiro continha informações adicionais que se encaixariam perfeitamente no reino por ele simbolizado, assim também os detalhes do chifre entre os olhos do Bode sendo arrancado no auge de sua força e substituído por outros quatro sem a mesma força que o primeiro, encaixam-se minuciosamente com os detalhes da história do reino helenístico. A história conta que o primeiro e grande rei do império macedônico, Alexandre o Grande da Grécia, no auge de suas conquistas acabou morrendo. Como não havia indicado sucessor, sua morte foi precedida por 22 anos de sangrentos conflitos que só vieram a termo no ano de 301 a.C. na batalha de Ipsus. Nesta batalha, não somente os esforços de Antígono em estabelecer um império mundial consolidado foram destruídos,  como também ficou definida a divisão do império greco-macedônico entre seus quatro principais generais: Cassandro, Lissímaco, Seleuco e Ptolomeu.

 

 

Antíoco Epifânio é o Chifre Pequeno?

 

Até aqui existe consenso entre a maior parte dos estudiosos da Bíblia. É a partir do verso 9 que começam as divergências de interpretação entre os Adventista e as demais denominações cristãs. De acordo com o princípio do paralelismo entre os capítulos 2, 7 e 8, os Adventistas reconhecem abertamente o Chifre Pequeno de Daniel 8 como sendo Roma em suas fases pagã e cristã apostatada, porém com ênfase na segunda fase. As demais denominações cristãs pretendem identificar o Chifre Pequeno com o insignificante Antíoco IV ou Antíoco Epifânio, que foi o oitavo rei da dinastia selêucida (175 a 164 a.C.).

 

Na tentativa de forçar a interpretação do Chifre Pequeno como Antíoco Epifânio, cometem um erro grave de gramática hebraica ao relacionar a expressão “de um deles” do verso 9 com os quatro chifres (existem até algumas versões bíblicas que perpetuaram este erro ao traduzirem tendenciosamente “de um deles” como “de um dos quatro chifres”). Na gramática hebraica a palavra “chifre” (qeren) do verso 8 é uma palavra feminina, e a palavra “ventos” (ruach) pode ser tanto masculina como feminina. Como o pronome pessoal “eles” (de + eles = deles) deve concordar com o substantivo que o antecede, este pronome deveria ser feminino caso ele realmente se referisse aos chifres. Porém, o que acontece é que na língua hebraica o “deles” do verso 9 é uma palavra masculina, sendo completamente inviável que ela esteja relacionada com a palavra chifres. O correto é a palavra masculina “deles” do verso 9 estar relacionada com a palavra “vento” que pode ser tanto masculina como feminina.

 

A lição de terça-feira (25/07) acertadamente explica:

 

No verso 8, depois de descrever o colapso da Grécia, fragmentando-se em vários reinos, o chifre pequeno é descrito como vindo ‘de entre eles’; isto é, de um dos ‘quatro ventos do céu’ (v.8), seu antecedente imediato.” (Pág. 58 da edição do professor).

 

Infelizmente o responsável pelos Comentários Adicionais errou e escandalosamente contradisse o autor da lição ao afirmar:

 

Depois de sua morte, o reino de Alexandre foi dividido entre quatro generais (v.22; compare Dan.7:6: ‘quatro asas’). De um desses pequenos reinos subiu ‘um chifre pequeno’ – pequeno a princípio, mas que cresceu em poder (Dan.8:9).” (Pág. 62 da edição do professor).

 

Primeiro ele menciona as quatro asas como o símbolo relacionado com a divisão do império macedônico em quatro partes, sendo que as quatro cabeças é um símbolo muito mais direto e lógico. Depois ele comete a terrível gafe teológica ao dar a entender que de um dos quatro “pequenos reinos” procedentes da divisão do império helenístico é que sobe o chifre pequeno. Este tipo de interpretação é justamente o que acreditam e defendem a maior parte das denominações cristãs que querem identificar o chifre pequeno como Antíoco Epifânio. Nós adventistas combatemos este tipo de interpretação equivocada.

 

A lição do 4º trimestre de 2004 foi muito mais precisa em sua explicação:

 

A maioria dos comentaristas entende que o chifre pequeno saiu de um dos quatro chifres, mas a gramática hebraica dá a entender diferentemente, que o poder do ‘chifre pequeno’ veio de um ‘dos ventos do céu’, não dos quatro chifres.

Porém, a última parte do verso 8 diz: ‘Saíram quatro chifres notáveis, para os quatro ventos do céu.’ Deste modo, a expressão ‘quatro ventos do céu’ é o antecedente mais próximo de ‘um deles’ e não dos ‘quatro chifres’. O chifre pequeno, então, sai de um dos quatro ventos (os pontos cardeais) em lugar de um dos quatro chifres. Além disso, o chifre pequeno cresce em direção a três entidades geográficas, ‘o sul’, ‘o oriente’ e ‘a Terra Gloriosa’. Esta segunda atividade do chifre pequeno sugere que a primeira atividade, ‘a saída’ também pertence ao plano geográfico, os quatro pontos cardeais. Finalmente, o verbo ‘sair’ (yatza) no verso 9 é diferente do verbo ‘sair’ (‘alah) que é usado para saída dos outros chifres (vs. 3 e 8). (Veja ainda M.Proebstle, ‘A Text-oriented Analysis of Daniel 8:9-14’ [tese de Ph.D., Universidade Andrews, 2003], págs. 100-104.)

Pela história, sabemos que o poder que veio depois dos quatro impérios gregos foi Roma, que surgiu de um ponto a oeste desses impérios.” (Pág. 105 da edição do professor – 23/11/2004).

 

C. Mervyn Maxwell em seu livro “Uma Nova Era Segundo as Profecias de Daniel” (pág. 158 da 1ª edição) apresenta 5 razões contra a interpretação do chifre pequeno de Daniel 8 como sendo o rei selêucida Antíoco IV, conhecido como Antíoco Epifânio:

 

1-              Chifres representam reinos, e ele foi apenas um rei individual (parte de um dos quatro chifres);

2-              Dan. 8:23 coloca o surgimento do chifre pequeno no fim do reinado dos reis simbolizados pelos quatro chifres que surgiram no lugar daquele chifre notável. Antíoco IV (175-164 a.C.) está situado no meio da linhagem dos reis selêucidas (312-65 a.C.);

3-              A história nega que este rei tenha prosperado (vs. 12) ou que tenha se tornado muito forte (vs. 9). Ele foi humilhado pelos Romanos no sul (Egito) e morreu sob circunstâncias obscuras e tristes no oriente ou leste (Mesopotâmia). Mesmo seu fugaz sucesso na terra gloriosa (Jerusalém) se desfez enquanto ele ainda vivia;

4-              Todas tentativas de encaixar as 2.300 tardes e manhãs no período em que Antíoco IV interrompeu o serviço do santuário e o profanou se demonstraram inconsistentes com os comprovados fatos históricos. Mesmo que se force o entendimento para entender as 2.300 tardes e manhãs como 1.150 sacrifícios diários (e portanto 1.150 dias ou aproximadamente 3 anos e 2 meses), este período não coincidirá com os 3 anos e 10 dias em que de fato o templo foi profanado (de acordo com I Macabeus 1:54 a 59 e 4:52-54 foi de 15º dia de Chislev de 168 a.C. até o 25º dia de Chislev de 165 a.C.);

5-              Jesus afirmou clara e explicitamente que a abominação desoladora que havia se referido o profeta Daniel ainda se encontrava no futuro em relação ao momento em que estava proferindo seu discurso (Mateus 24:15). Antíoco Epifânio morreu cerca de dois séculos antes destas palavras de Jesus, e portanto é ilógico pensar nele como que cumprido a profecia do chifre pequeno de Daniel.

 

Por outro lado, a simples aplicação do princípio do paralelismo que aponta o poder que sucedeu ao Bode do capítulo 8, como o mesmo poder que sucedeu o Leopardo do capítulo 7, e o mesmo poder que sucedeu a parte de bronze do capítulo 2, ou seja, Roma, é ainda a principal evidência de que o Chifre Pequeno jamais poderia ser um rei tão geograficamente restrito e de tão pouco destaque como foi Antíoco Epifânio.

 

Um outro argumento muito simples que desbanca completamente Antíoco Epifânio é o fato de por duas vezes (versos 17 e 19) o anjo Gabriel dizer claramente que a visão se cumprirá no “fim do tempo” ou no “tempo do fim”. Não tem fundamento alguém querer entender que a purificação do santuário de Daniel 8:14 refere-se ao momento que as profanações de Antíoco Epifânio no templo judeu terminaram, se a data em que isto ocorreu é antes mesmo do nascimento de Cristo que, por sua vez, colocou o tempo do fim no futuro (Mateus 24:3-14).

 

Como já mencionamos no início deste comentário, a lição nº. 10 será dedicada exclusivamente a este assunto (Roma e Antíoco), portanto, caso ainda tenha ficado alguma dúvida, ao chegarmos lá poderemos nos aprofundar ainda mais neste assunto.

 

 

O Chifre Pequeno

 

As peripécias do Carneiro e do Bode, identificados pelo próprio anjo que recebe a ordem para explicar a visão para Daniel como o rei (reino) da Média e da Pérsia e o rei (reino) da Grécia, preparam o cenário para a parte mais impressionante da visão: o surgimento de um Chifre muito pequeno que cresceu muito para o sul, para o oriente e para a terra formosa.

 

Estas indicações políticas confirmam sua identificação como sendo o Império Romano, pois destacam sua expansão rumo a África (sul), Grécia, Ásia Menor e Síria (oriente), e Palestina (terra formosa). Entretanto, estas características políticas são apresentadas de forma bem sucinta e limitada, em comparação com as demais características de caráter espiritual. Fica evidente que o objetivo do capítulo 8 é apresentar o engrandecimento do Chifre Pequeno em termos espirituais, destacando a natureza espiritual ofensiva de suas atividades.

 

Veja abaixo uma comparação entre o crescimento político (horizontal) do chifre pequeno com seu engrandecimento espiritual (vertical):

 

 

Atividade Horizontal

Atividade Vertical

Crescimento Político

Engrandecimento Espiritual

Roma Pagã

Roma Cristã

1-               Sul

2-               Oriente

3-               Terra Formosa

1-               Contra o exército dos céus

2-               Contra o Príncipe dos príncipes

3-               Contra o Santuário

4-               Contra a verdade

Daniel 8:9

Daniel 8:10-12 e 23-25

 

 

Como já vimos no capítulo 7, Roma Pagã teve sua continuação na Roma Cristã, onde o Bispo de Roma acaba substituindo em poder e influência o imperador Romano. O título pagão Pontifex Maximus (Sumo Sacerdote) utilizado pelos imperadores romanos passou a ser um título cristão que identificava o Bispo de Roma, de forma que o poder, autoridade e influência antes exercidas pelos imperadores romanos foram lenta, gradativa e sutilmente transferidos para o chefe da igreja cristã em Roma.

 

 

Purificação do Santuário

 

O tema do santuário é central em Daniel capítulo 8. Uma das provas é que até os animais escolhidos por Deus para simbolizar o império Medo-Persa e Macedônico são animais pertencentes ao ritual do santuário: um carneiro e um bode.

 

De acordo com já comprovado princípio do paralelismo entre as visões de Daniel, verificamos que a Purificação do Santuário do capítulo 8 está indiscutivelmente em direta relação com Tribunal Celestial do capítulo 7. A evidência bíblica é tão forte que não existe como refutar esta relação. Perceba que tanto o Tribunal no capítulo 7 quanto a Purificação do Santuário no capítulo 8 ocorrem após a manifestação do 4º poder mundial/Chifre Pequeno. E para provar isto temos não somente uma seqüência bíblica, mas duas:

 

 

Seqüência

Acontecimento

Daniel 7

Acontecimento

Daniel 8

1ª seqüência

Chifre Pequeno se manifesta

Verso 8

Chifre Pequeno se manifesta

Versos 9-12

Tribunal Celestial

Versos 9-10

Purificação do Santuário

Versos 13-14

2ª seqüência

Chifre Pequeno se manifesta

Versos 24-25

Chifre Pequeno se manifesta

Versos 23-25

Tribunal Celestial

Verso 26

Purificação do Santuário

Versos 25-26

 

 

E mais, tanto após o Tribunal Celestial do capítulo 7 como após a Purificação do Santuário do capítulo 8, temos na seqüência a destruição definitiva do Chifre Pequeno (comparar Daniel 7:26 com 8:25).

 

Como vimos, está inegavelmente claro a relação que existe entre o Tribunal celestial e a Purificação do Santuário, bem como a seqüência em que ocorrem, ou seja, após a manifestação do Chifre Pequeno e antes da 2ª vinda de Jesus, quando ele será definitivamente destruído.

 

A interpretação correta da profecia que se segue (Daniel 9) dependerá substancialmente do entendimento deste paralelismo. Sem esta compreensão não conseguiremos ver a vital relação entre o capítulo 8 e 9, fazendo com que a profecia das 70 semanas surja como um elemento completamente desconexo nesta seqüência de profecias.

 

 

VOLTAR